SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

GRANIZO NO SERTÃO, TEMPESTADE DE AREIA, O TEMPO DÁ SEUS SINAIS


Rangel Alves da Costa*


Um fato mais que inesperado ocorreu neste domingo, dia 04, no município sergipano de Gararu, na região sertaneja do estado, quando uma chuva de granizo desabou no povoado Lagoa de Dentro, numa região cuja seca já se estende por mais de ano. As filmagens não deixam mentir.
Com efeito, durante cerca de vinte minutos pedrinhas de gelo caíram juntamente com os pingos grossos da chuvarada. Situação mais que inusitada, principalmente ante o costume de se conviver com labaredas de sol escaldante sobre a pele, logicamente que muitos temeram até pelo pior. Ou o mundo estava acabando ou a fúria do tempo mostrava do que é capaz.
Outro fato inesperado aconteceu na última segunda-feira na região oeste da Bahia, entre os municípios de Luís Eduardo Magalhães e Barreiras, quando uma tempestade de areia formou uma verdadeira barreira amarelada pouco antes do entardecer. Não uma ventania forte ou um vendaval de repente surgido, mas uma imensa cortina de poeira e pó que se fazia imaginar estar diante de uma verdadeira tempestade de areia saariana.
Mais uma vez o temor tomou conta de todos aqueles que passavam pelo local e presenciaram aquilo que mais parecia uma praga contra faraó. A região nordestina está acostumada a redemoinhos - e de todos os tipos -, mas não a manifestações arenosas iguais aquela, varrendo tudo. Só mesmo na televisão se observa aqueles malucos atrás de furacões, tempestades e demais demonstrações furiosas da natureza, porém ali pareceu mesmo coisa do outro mundo.
No município de Canindé do São Francisco, no Alto Sertão Sergipano do São Francisco, um dos mais castigados pelas estiagens, no último dia 04 um raio atingiu a antena retransmissora da Rádio Amanhecer FM e a estação teve que paralisar suas atividades. Já noutra região da Bahia, a força de um raio acabou matando nada menos que quinze reses numa propriedade.
Os raios, porque geralmente antecedem as tempestades, as trovoadas e outras fortes chuvaradas, são fenômenos raros pelos céus nordestinos, principalmente na região mais semiárida do sertão. Com as secas frequentes e a escassez de nuvens carregadas, somente quando os acúmulos lá em cima se tornam insustentáveis é que os raios e os trovões irrompem para anunciar a boa nova do sertanejo. Mas este nunca espera que raios possam fazer a parte mais destrutiva das chuvaradas. E de repente acontece, derrubando árvores, destruindo antenas e matando pessoas e animais.
Mas como dizia o velho Pascácio, a coisa no sertão é tão feia que nenhuma boniteza chega que não cobre além da medida. Para uma ideia de tal assertiva, as trovoadas tão desejadas e esperadas acabam provocando um sofrimento terrível aos animais fraquejados pelas duradouras estiagens. O gado está tão magro e tão fraco, no verdadeiro couro e osso, que sequer suporta a chuvarada por cima. E também não encontra forças para caminhar sobre a terra molhada, pesada, lamacenta, e então desaba. Ou o sertanejo acorre em socorro ou ali mesmo se tornará comida de urubus e outras aves carnicentas.
O que o homem nordestino sempre espera é que o tempo não o considere como inimigo. Quer dizer, sempre deseja não ser tão castigado pelas secas de ano a ano, não ter seu roçado transformado em deserto, não ter de suportar tanto sofrimento de seu pequeno rebanho e poder plantar e colher o alimento da sobrevivência. Significa algo muito simples: uma normalidade climática como ocorre nas demais regiões, onde as chuvas demoram mas sempre caem.
Contudo, o que sempre encontra como resposta é a estiagem maior a cada ano, e ano após ano. E quando as chuvas chegam vêm trazendo o inesperado lá de cima: granizo, raios, pingos desmedidos e outras situações imprevistas. Mas o sertanejo deveria se atentar para um fato: a sua região está totalmente devastada pela ação do próprio homem. A vegetação nativa praticamente foi dizimada, não há mais mata fechada, tudo foi devorado pela coivara, pelo facão e pelo trator. E a consequência disso não poderia ser outra.
Uma das consequências mais conhecidas é o aumento da temperatura. O calor insuportável da região não é apenas fruto das predisposições do El Niño, mas da terra nua que se chama sertão. Sem sombreado, sem arvoredo, sem planta que oxigene os espaços, quando o sol cai vai logo espalhando sua língua de fogo sobre tudo. E do jeito que vai, com a desenfreada destruição dos recursos naturais sertanejos, muito mais acontecerá. E granizo parecerá picolé.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

Nenhum comentário: