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domingo, 7 de dezembro de 2014

O NADA E OUTROS PESSIMISMOS


Rangel Alves da Costa*


A realidade é cheia de insignificâncias, de coisas efêmeras, de nada. Até mesmo o tudo alardeado depois se revela como coisa nenhuma.
O destino do ferro é a ferrugem, da madeira de lei o cupim, do cimento o pó, da vida a morte. Nada é pleno, absoluto, potente, indestrutível. Tudo existe com a sina do desaparecimento.
Os grandes impérios ruíram, os grandes conquistadores foram conquistados pela ganância, os reinados absolutos jazeram sobre os escombros das civilizações. E as civilizações floresceram e desapareceram como chegaram. E assim também acontecerá com o mundo novo.
De nenhuma valia ter tanta riqueza, tanto apego a bens materiais e ao poder. Todos são seres nus na mesma pobreza. Todos são as mesmas pessoas nos seus destinos. E mais ainda doloroso para aqueles que imaginam que fruirão além-túmulo de qualquer tostão.
A verdadeira riqueza está naquele que colhe o fruto na hora da fome, encontra guarida na hora do cansaço, se enche de contentamento por tudo o que deseja naquele momento. Não pensa em guardar, em ter além do necessário nem lança mão daquilo que não lhe será útil no instante.
As vaidades são os cálices envenenados do homem. Quanto mais brilha o cálice e quanto mais vinho transborde, mais o homem lança seus lábios com a voracidade dos sedentos, ainda que saiba que correrá risco de morrer no instante seguinte. O que lhe importa é viver a ganância do ter.
Pessoas suicidam porque perdem suas fortunas, mas todos morrem por viver somente de fortunas. A rainha destronada preferiu andar nua a vestir roupa humilde de camponês. E o pobre rei, destronada também de toda moeda de ouro, enlouqueceu contando estrelas e acreditando ser sua riqueza.
De que vale uma felicidade falsa, construída e mantida na aparência? De que vale achar que o brilho do ouro é mais fascinante que a luz do sol e da lua? Muitos fogem das ruas, das pessoas, das palavras, porque se acham importantes demais para se misturar aos seus submissos. Enquanto o velho sábio preferiu o enclausuramento na gruta da montanha a lançar o olhar a pessoas assim. E ali permaneceu conversando com Deus.
Vaidade das vaidades, tudo vaidade. De ouro vestido, em diamante calçado, com rubis nos olhos e pétalas na boca. No entanto, seu destino é a morte. E mais apressadamente é chamado que aquele que negou um pão, um moeda, um olhar.
Será preciso compreender a vida para não ser por ela surpreendido. O ser humano é muito menos que o menos que imagine ser. É, verdadeiramente, um nada. E ainda mais quando se despoja da espiritualidade, da fé, da religiosidade, de uma crença verdadeira.
A pedra sabe que não passa de pó, que em minúsculo grão será transformada e como simples poeira tomará seu destino. E por isso mesmo reconhece sua transitoriedade e insignificância, sua valia de nada, ainda que simbolize a consistência de tudo.
O jardim florido também sabe que terá seu momento de esmaecimento, de fragilidade, de agonia e morte, ao menos perante aquela estação. As flores tão belas, perfumadas e radiantes se curvarão ao sol, ao tempo, ao outono voraz. E pétala a pétala se deitarão pelos canteiros esturricados.
E assim também com o arvoredo que será desnudado pela mão do outono e terá seus galhos encurvados e suas folhas levadas por qualquer ventania. A pujança verde perderá sua seiva, o viço se transformará em palidez, toda folha se dobrará sem cor, feia, morta, para cair ou ser levada além.
E nada poderá ser feito para que alguma coisa aconteça de outro modo, de uma forma menos voraz e dolorosa. E assim acontece porque as coisas do mundo possuem uma existência própria e nenhum ser humano poderá interferir no seu rumo. Nem ele próprio, que acredita ser tão poderoso, é capaz de mudar a direção da ventania que vai lhe levar.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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