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segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

AS CEIAS E OS PRESENTES


Rangel Alves da Costa*


Para muitos, tanto faz que Papai Noel exista ou não, que ele visite ou não qualquer menino sonhador, mas a ceia natalina não pode deixar de existir de jeito nenhum. Em nome da comilança todo o espírito natalino.
A ceia de natal não é só costume e tradição, mas o instante mais esperado do ano para o empaturramento com tudo que aparecer. É a simbologia da gula para grande parte da população. Os pratos cintilam mais que as luzes natalinas.
E lambem os beiços só em pensar nas comidas e sabores tantos que chegam à mesa em profusão. Assados, mexidos, empanados, molhados e sólidos, pratos de todos os tipos. Sem falar no sortimento de bebidas e outros manjares que aparecem.
Um natal assim, nos moldes do esbanjamento, outra coisa não simboliza senão o consumismo materialista, a gula desenfreada, a demonstração à mesa da bonança financeira dos anfitriões. Bem assim nos enfeites natalinos, pois renas imensas, alegoricamente faiscantes, estarão espalhadas pelos jardins.
Na verdade, o natal transformou-se em mera ocasião de prazeres materiais. Logicamente que não para todos, mas para uma parcela significante da sociedade é apenas um período de troca de presentes, confraternizações suntuosas, festanças as mais abastadas. Ora, o comércio tem-no como um milagre.
Até mesmo os tradicionais amigos secretos estão se transformando numa disputa de valores e qualidades. Não faz muito tempo que era máximo o contentamento daquele que recebia uma lembrancinha singela, algo apenas para simbolizar a existência da amizade. Mas hoje não. Triste daquele que entre na brincadeira e tente oferecer um presentinho qualquer. Automaticamente será transformado em inimigo mortal.
Faltam as luzes e os símbolos no coração e sobram as demagogias. Muitos se revestem do natal apenas para apregoar o que não sentem, para fingir caridades, para espalhar falsos gestos humanitários. E em meio aos fingimentos e aberrações, restam solitários e esquecidos aqueles que traduzem na alma o verdadeiro natal. 
E não esquecendo aqueles que praticam caridade em nome próprio com o que foi doado pelos outros. E muitos, talvez se achando também carentes, reservam para si grande parte dos donativos natalinos. E ainda dizem não acreditar em Papai Noel.
Na noite de natal, ainda que a ceia seja preparada para reduzida família, ainda assim os pratos sempre serão alentados. No dia seguinte e depois ainda é possível se fartar com os restos que parecerão ainda mais gostosos e suculentos. Há quem sustente ser o dia seguinte a verdadeira comemoração.
E se a ceia é preparada para família grande, muitas pessoas e convidados, então será preciso juntar algumas mesas para espalhar os sortimentos. É o momento em que o cardápio vai muito além dos tradicionais pratos da ocasião. É quando iguarias importadas se misturam às aves gordas da ocasião.
Bebidas finas, copos de cristal, champanhes e vinhos de safras antigas, uísque já ancião, garrafas com rótulos de difícil leitura. E aquelas pessoas com roupas cheias de etiquetas e desconfortos, com tantos brilhos que rivalizam com a luminescência dos cristais se tocando em brinde. Ninguém fala nada do natal, apenas nos planos capitalistas para o ano vindouro.
E na mesma hora, só que em outro lugar, a mesma ceia, ou aquilo que o termo possa traduzir, estará sendo servida, porém de modo muito diferente. Não uma janta especial, com alimentos diferenciados, mas aquilo de todo dia, e quando todo dia tem para ser servido. E muitas vezes a ceia que é café, almoço e janta num só prato e servida uma única vez ao dia.
Uma ceia que se resume ao pão, e porque o pão foi nesse dia conseguido. E então a verdadeira comemoração no humilde coração natalino. Ter o pão como ceia e o melhor presente. Sem bola, sem brinquedo, sem nada, mas o menino adormecerá contente porque qualquer dia terá um sapatinho para colocar na janela. Se janela houver.

Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com 

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