SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



domingo, 22 de setembro de 2013

SERTANEJAS VESTIDAS DE SOL


Rangel Alves da Costa*


Aura ensolarada e tez envernizada pelo calor do dia; olhar meigo e distante e sorriso sempre acenando; uma sertaneja, uma mulher vestida de sol. Os romances, as novelas, a poesia e até as conversas de boca a boca sempre reconheceram a beleza simples e singela da mulher sertaneja.
E uma passagem bíblica, logicamente expressa noutro contexto, servirá muito bem para sintetizar tal reconhecimento. Diz o Livro do Apocalipse, 12,1 que:  Apareceu em seguida um grande sinal no céu: uma mulher vestida do sol, tendo a lua debaixo dos seus pés e uma coroa de doze estrelas sobre sua cabeça.
Ora, a mulher vestida de sol não era outra senão Maria, mãe de Jesus. E Maria, mais que qualquer outro, é nome que simboliza a mulher sertaneja. E estar revestida de sol, tomada pelos seus raios, também não deixa de remeter ao sol sertanejo pairando sobre suas belas filhas.
E mais. No contexto sertanejo, ter a lua debaixo dos pés pode muito bem significar a procura por momentos de paz e felicidade e também os instantes propícios para a caminhada em busca de dias melhores. Tendo o sol sobre sua cabeça, símbolo de luz mas também de padecimento, tem a lua sobre seus pés simbolizando a paz tão almejada.
E o que seria a coroa de doze estrelas sobre a cabeça da mulher sertaneja? Na Bíblia, as doze estrelas representam os doze apóstolos, aqueles escolhidos para semear as palavras de Deus. Perante a realidade sertaneja, cujo aprendizado é fruto da vivência no seu chão, a coroa de doze estrelas seria o diadema refletindo as singularidades dessa mulher também singular.
Tais singularidades podem ser encontradas em algumas características sempre existentes na verdadeira mulher sertaneja. Desse modo, as doze estrelas seriam: simplicidade, humildade, perseverança, amizade, destemor, honestidade, singeleza, religiosidade, beleza, meiguice, cordialidade e força.
Eis, assim, a mulher sertaneja vestida do sol de seu mundo, caminhando em busca de reconhecimento e conquistas, sempre ornada com as características básicas que lhes dão singularidade e encanto. E não haverá alguém que tenha bons olhos para ver, sincero coração para sentir e razão para discernir, que não veja em cada uma a mais pura expressão da singela e encantadora feminilidade.
E não importa se mora numa tapera de barro e cipó, nos escondidos da mataria distante, nas margens empobrecidas dos centros urbanos ou nas cidades. Não importa se usa chinelo de dedo ou sapato enfeitado, se usa vestido de chita e flor no cabelo ou roupa comprada em butique. Não importa se pobre ou rica, bastando que se revista daquele sol sertanejo para ser reconhecida na sua beleza.
Contudo, mesmo o sol sertanejo, reconhecido pela sua força e fulgor, deixa de brilhar sobre aquelas cabeças que, falseando sua vivência e seu meio, insistem em transgredir as características e conceitos próprios da mulher sertaneja. Tomadas pelos modismos, tantas vezes omitindo o seu próprio chão, acabam se desvirtuando nas tentativas de ser aquilo que, por destino e escolha divina, não lhes foi permitido.
Mas as ovelhas desgarradas logo deixam de ser reconhecidas pelo rebanho. E naquelas que continuam abraçando sua terra com orgulho e prazer, que permanecem com hábitos e costumes próprios de seu mundo ou que se tornam modernas sem ser diferentes, nestas sempre será avistada toda a beleza cabocla.
Pois, repetindo sempre, beleza sem igual é a desta mulher. Desde aquela mocinha que ao entardecer fica sonhando na sua janela, aquela outra que se respinga de lavanda para atrair olhares sempre apaixonados, ou ainda aquela outra que simplesmente passa e os olhares se enchem de graça e a paisagem agrestina agradece por existir assim tão majestosa. E também a já envelhecida, calejada pelas labutas tantas. Uma flor, ou flores sertanejas. Simplesmente isso.
A bela flor do cacto e do inexistente jardim sertanejo. Inexistente pela aspereza da terra e pela sequidão do tempo, mas quando existir ali garantida já estará sua flor: bela flor que é essa mulher vestida de sol.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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