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segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

AMORES (AINDA) POSSÍVEIS (Crônica)


Rangel Alves da Costa*


Num tempo muito distante, quando as pessoas viverem em estado apenas de suportabilidade de um para com o outro, as más virtudes prevaleçam sobre a vida em comunhão e o amor estiver tão banalizado que poucos ainda acreditarão na sua força e poder, ainda assim será possível amar. E amorosamente amar.
Palavras de um velho sábio, ditas pelos caminhos passados, quase como uma vidência ao que aconteceria nos dias atuais. Mas perguntado pelo discípulo como podia falar em amor como sentimento prevalecente entre dois que se gostam, quando jamais experimentara um relacionamento amoroso, o velho sábio simplesmente respondeu:
Ora, o amor não exige conceito, conhecimento, teoria ou prática incessante para ser compreendido, valorizado, perseguido e efetivamente amado. O amor é feito flor do campo que lindamente brota nas asperezas da terra. Não precisa ser semeado intencionalmente, pois germina onde poderá florescer. Olhai a vida por cima da pedra, o que lindamente nasce quase na impossibilidade.
O amor sempre será possível naqueles que primeiro conheceram o amor cordial, humano e afetivo consigo mesmos e perante o próximo. Conhecendo o amor sentimental, aquele que deve ser presença constante na vida, certamente que as pessoas poderão dar voos mais altos, procurar cimentar os sentimentos ao lado de outra pessoa merecedora.
Verdade que não amei aquele amor do profundamente gostar, do abraço, do beijo, da intimidade, da relação carnal, mas conheço suas raízes. Ora, meu bom discípulo, as coisas e os fatos que devem ser e como devem ser não precisam que sejam vivenciados ou experimentados para ser conhecidos. As formas de amor que falei são da essência humana, de sua natureza e, portanto, devem ser antecipadamente conhecidas por todos.
Está escrito que o amor é sentimento que não pode ser mantido escondido ou negligenciado. Ninguém pode guardar amor para amar depois. Ou ama o que deve ser amado ou não conhece o que seja amor, ou ainda está desvirtuando sua serventia. Mas, que se diga meu bom discípulo, a ninguém é dado o direito de forjar desejos ou sair por aí, aleatoriamente, fazendo perigosas experiências com seus sentimentos. E também dos outros.
O amor é possível toda vez que a pessoa passe a ter consciência que está preparada para amar. Exige-se tal conhecimento prévio porque ninguém entra numa relação já sabendo as dimensões do amor sentido. Ora, meu bom discípulo, minha sede não me permite avidamente debruçar sobre qualquer veio d’água que encontre adiante. Tudo pode ser muito perigoso sem o conhecimento e o preparo.
Preparando-se para o amor poderá, a um só tempo, definir o que se adequa ao seu sentimento, o que pretende encontrar no outro, quais os caminhos a serem percorridos na construção do relacionamento, antever alguns perigos e armadilhas e como fazer para evitá-los. Por fim, ter a consciência do que está reservado àqueles que percorreram com tenacidade os caminhos do fortalecimento da relação. A eternidade, enquanto durar a vida.
Mas não imagine, meu bom discípulo, que igualmente todos possam percorrer tais caminhos. Na estrada todos podem colocar os pés, mas só conseguirão seguir cada vez mais adiante aqueles que, ainda descalços, souberem o que pretendem na vida e o que desejam encontrar como prazer da existência. A cada passo da estrada estarão construindo o futuro e neste certamente estará dar conforto amoroso ao coração. E assim verão que é preciso amar, e amor que conduz à união entre dois.
Por isso mesmo, meu bom discípulo, ainda que nos tempos agora anunciados já estaremos petrificados sob as encostas dos rochedos, lentamente trazidos como pó pela ventania da vida, vislumbro a possibilidade da existência do amor. Será possível encontrar tal sentimento em alguns poucos corações sinceros.
Será um tempo sombrio, violento, de guerras, ameaças, desumanidades, de devastações, mas ainda assim haverá lugar para os bons corações. E nestes a semeadura de todo amor, e até do amor verdadeiro entre dois, pois as raízes que alimentam os corações serão as mesmas que temos agora. Mas poucos serão os que saberão encontrá-las.
  

Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com   

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