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A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



terça-feira, 9 de outubro de 2012

O QUE GOSTAM DE OUVIR (Crônica)


Rangel Alves da Costa*


Não há ouvido que não esteja atento para o que gosta de ouvir. E também não há ouvido que não se finja de surdo diante daquilo que não lhe seja agradável, proveitoso, elogiável.
Não há orelha que não se largueie ao sentir que nas proximidades alguém lhe joga confetes ou tece louvores a seu respeito. Contrariamente, dificilmente alguém vai se aproximar para escutar insultos, escárnios, desmoralizações.
Como o ser humano sente prazer em ser reconhecido positivamente, sua audição parece ter uma sensibilidade especial para ouvir tal reconhecimento. Já soa bem ouvir um belo cumprimento, uma saudação educada, que dirá um aplauso verbal.
Os enamorados que vacilam procurando palavras bonitas para agradar sua pretendida, deveriam ter na ponta da língua algumas poesias românticas. Mesmo que não entenda nada de poética amorosa, dificilmente alguém vai ficar chateado ou sentir amolação ao ouvir Vinícius, Cecília, Florbela Espanca.
Mas não precisa recitar clássicos universais sob pena de o outro querer saber mais sobre a vida e obra do autor e tudo ir por água abaixo. Explicar Shakespeare não é pra todo mundo. Para fugir de aperreios de última hora, talvez seja até melhor ser o mais verdadeiro possível e puxar do bolso um versinho de sua inspiração. Porém, sem ser açucarado demais.
Gesto que sempre dá bom resultado é chegar diante da pretendida com uma flor ou mesmo um buquê e dizer que achou as flores tão bonitas quanto ela. Entrega com um leve beijo e depois acrescenta que jamais poderia encontrar um jardim com roseira tão bela e perfumada. É um tanto infantil, porém não corre o risco de ser correspondido com outro gesto que não um sorriso. E daí em diante...
As palavras não precisam ser rebuscadas, cheias de floreios, acima da normalidade comunicativa. Também não necessitam ser escolhidas a dedo, decoradas ou forjadas para repassar uma ideia. Corre-se o risco de tornar sem sentido um diálogo que pode ser prazeroso e generoso entre todos. Certamente que muitos gostam da simplicidade das coisas, e tal fato já demonstra que uma brisa labial é sempre melhor recebida que uma ventania verbal.
As palavras simples, doces, meigas e sinceras sempre encantam. Não há ser vivente que não fique desarmado quando ouve do outro uma palavra graciosamente sentida no âmago.  De repente, da pedra sai uma flor, do penhasco se derrama a bromélia, da escuridão vai surgindo a mansa luz. Por isso que a natureza se enche de prazer ao ouvir o cantar dos passarinhos, o farfalhar das folhagens. E a natureza humana?
Shakespeare já disse que seja como for o que penses, creio que é melhor dizê-lo com boas palavras. Mas muito cuidado, ainda que as palavras sejam as mais bem intencionadas, pois a intencionalidade repentina tem o dom de expressar o indesejado. Sempre será preciso refletir antes de dizer qualquer coisa. Neste sentido já asseverou Goethe que as pessoas tendem a colocar palavras onde faltam ideias.
Creio que nem seria preciso dizer o quanto reflete negativamente no outro ouvir aquilo que não esperaria no momento. O problema é que é forçado a ouvir sem saber qual a verdadeira intenção de a pessoa ter pronunciado. Isto porque a palavra pode ferir como um raio sem que o sujeito tenha o mínimo intento. Às vezes, por um descuido, a palavra sela de pronto uma inimizade.
Será preciso, pois, evitar riscos ao tentar agradar um e outro com palavras impensadas. Tem gente que acha muito normal encontrar um amigo e dizer que o mesmo está muito mais forte. Também é muito normal que o amigo entenda que o outro o chamou de gordo. E quem é que gosta ser chamado gordo, largo, barrigudo?
Por isso mesmo que na dúvida prefira o silêncio. No amor, na falta da melhor palavra para a ocasião prefira o silêncio. Certamente que a voz da mudez, no olho apaixonado mirando o olho que quer, ecoará tão fortemente que o coração se sentirá compreendido demais.
Por fim, refletindo nas palavras de Madre Teresa de Calcutá: “Todas as nossas palavras serão inúteis se não brotarem do fundo do coração. As palavras que não dão luz aumentam a escuridão”. “As palavras de amizade e conforto podem ser curtas e sucintas, mas o seu eco é infindável”.
  

Poeta e cronista
e-mail: rac3478@hotmail.com
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