SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



sábado, 29 de setembro de 2012

PALAVRAS SILENCIOSAS - 28

                           
                                             Rangel Alves da Costa*


“Chove lá fora...”.
“E aqui faz tanto frio, como diria Lobão...”
“Mas não me dá vontade de saber onde está você...”.
“O que se tem à mão não se procura ao desvão...”.
“Me dê você pra mim!...”.
“Me toma, me leva, nesse friozinho gostoso, nessa chuva lá fora...”.
“Acolher no meu cobertor...”.
“Prefiro que no lençol do corpo...”.
“Então serei tempestade, trovoada...”.
“E eu o medo, o pavor, procurando ainda mais abrigo...”.
“E o que pensa fazer do meu clima?”.
“Quero a enxurrada, quero ser levado...”.
“Mas sou leito de águas mansas...”.
“Mas no teu corpo não sei nadar...”.
“Depois da tempestade...”.
“A paz ao teu lado...”.
“A mansidão...”.
“A paz...”.
“Depois da chuva me farei relva verdejante...”.
“Assim com as folhas de relva...”.
“A poesia de Whitman, aquele cuja barba parece levada ao vento...”.
“Lembro alguns versos dele...”.
“Então deite na minha relva e declame...”.
“Casas e quartos se enchem de perfumes .... as estantes estão entulhadas de perfumes/ Respiro o aroma eu mesmo, e gosto e o reconheço/ Sua destilação poderia me intoxicar também, mas não deixo/ A atmosfera não é nenhum perfume .... não tem gosto de destilação .... é inodoro/ É pra minha boca apenas e pra sempre .... estou apaixonado por ela/ Vou até a margem junto à mata sem disfarces e pelado/ Louco pra que ela faça contato comigo...”.
“Maravilhoso. lembra mais alguma coisa da poesia de Whitman?”
“Diz o poeta, ainda em Folhas de Relva: Uma criança disse/ O que é a relva? trazendo um tufo em suas mãos/ O que dizer a ela?.... sei tanto quanto ela o que é a relva/ Vai ver é a bandeira do meu estado de espírito, tecida de uma substância de esperança verde/ Vai ver é o lenço do Senhor/ Um presente perfumado e o lembrete derrubado por querer/ Com o nome do dono bordado num canto, pra que possamos ver e examinar, e dizer/ É seu?”.
“Na relva a poesia, o contentamento, nós dois sonhando de olhos abertos. E quando o sono chegar?”.
“Quero continuar sonhando...”.
“O sonho de agora, com a chuva caindo?”
“Não há coisa melhor do que deitar e ficar ouvindo o barulho cadenciado da chuva caindo...”.
“Também gosto, mas me deixa angustiada...”.
“Não sei por que, mas ouvir a chuva traz uma certa melancolia...”.
“O pensamento viaja, voa...”.
“E de repente chega a lugares que nem queríamos...”.
“Chegam as saudades, as recordações, as muitas lembranças...”.
“Mas não só por causa da chuva caindo. A noite, o silêncio, o zunido do vento...”.
“Tudo chama à reflexão...”.
“Deveríamos aproveitar mais esse momento...”.
“Fazer da noite a voz, o espelho, o diálogo...”.
“Sim, fazer da noite um encontro...”.
“E nesse encontro o reencontro...”.
“Porque não podemos fugir de certas lembranças...”.
“Dói, mas elas precisam chegar assim...”.
“E vejo uma face distante...”.
“Vejo o semblante de minha mãe...”.
“Vejo os meus que já partiram...”.
“E neles também me vejo...”.
“Porque também somos eles...”.
“Ainda que continuemos nós!...”.

  
Poeta e cronista
e-mail: rac3478@hotmail.com
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