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A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



sábado, 14 de abril de 2012

“B” DE SAUDADE (Crônica)

                                              
                                            Rangel Alves da Costa*


Pode parecer muito estranho falar em “b” de saudade. Verdade é que geralmente se diz “a” de amor, “p” de paixão, “v” de você”. Mas então por que “b” e não “s” de saudade?
Ora, simplesmente porque “b” vem de beijo, e o beijo que um dia dei em você me fez agora estar com saudade.
Eu lhe avisei meu bem, eu lhe avisei. Ainda que não tivesse dito com palavras, mas você poderia muito bem compreender o quanto seria perigoso me beijar assim.
Eu quis fugir meu bem, eu quis fugir. Quando me acheguei, olhei no seu olhar, acariciei seus cabelos e aproximei minha face da sua face, juro que pensei em não aproximar a boca da sua boca.
Eu tive medo meu bem, eu tive medo. Tive medo de tocar meu lábio no seu lábio, molhar a sua boca com minha saliva, ficar pertinho do céu. No céu de sua boca...
Não suportei meu bem, não suportei. Um impulso, um ímpeto, uma força estranha, uma desmedida vontade, e de repente o barco já não obedecia ao comando.
E naveguei meu bem, eu naveguei, sentindo a onda do seu corpo me levar ao mar aberto e talvez rumo a essa maravilhosa e desconhecida terra que é o amor.
Canto de sereia, iara menina, feitiço de lua, e quanto medo de fechar mansamente os olhos e não despertar mais em mim, levado que fui pela onda mais quente que esse mar de amor me soltava para seguir adiante.
E descobri meu bem, eu descobri um mundo novo, um paraíso no meu ser, jogado ao porto de leito virgem, nativa margem encontrada em você.
Mas não quis me deixar fazer cativo desse porto moreno fácil não. Temendo as consequencias da paixão, de repente me vi com toda a força sobre-humana que o homem possa ter nessa situação.
Nenhuma. Nenhuma força diante da força cativante, da respiração acelerada que se torna sufocante, do náufrago que de repente é amante, desse calor que abrasa tudo num rompante.
Fazer o que, meu amor? Um náufrago na idade de descobrir, um jovem marinheiro que encontra o porto mais desejado, o navegante de repente apaixonado. E, por lógico instinto, senti sede e quis beber da sua boca. Então beijei e fui beijado...
Mas por que isso aconteceu, meu amor? Ora, aquele beijo poderia ter sido outro beijo, beijado de forma diferente. Um beijo na face talvez, um beijo apenas desejado.
Mas você aceitou o meu beijo e me beijou. E ao aquiescer com tal carícia de amor, selou dentro de mim algo muito além de um simples prazer momentâneo.
Acredite ou não, mas aquilo não foi um beijo, aquilo não foi apenas um toque de pele para despertar um desejo, e sim a chave para um mundo estranhamente maravilhoso, mas também perigoso e temeroso demais.
Aquilo, tão simples assim se dizer, foi o amor nascendo, foi o querer surgindo, foi a paixão emergindo, foi a vida em pleno contentamento. Oh, meu amor, que bom seria se tudo continuasse assim...
Que bom, meu amor, seria que tudo continuasse assim...
Mas depois de cantar seu canto, de dar o beijo que se fez encanto, a sereia mergulhou nas águas da distância e sumiu. Você partiu meu amor, você partiu...
Deu-me um beijo, me fez amado, me fez perdido, me deixou apaixonado, e depois partiu. Você sumiu meu amor, você sumiu...
Lembro bem do seu sorriso ao dizer que voltaria, que depois talvez outro beijo porque amanhã outro dia. E aconteceu o que eu jamais queria.
Agora esse porto jardim, essa ilha, essa praça, esse lugar que sempre volto para lhe encontrar e nunca mais te ver. Meu amor, onde está você?
É muito estranho, mas o “b” de beijo é o mesmo “b” de saudade.



Poeta e cronista
e-mail: rac3478@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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