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quarta-feira, 21 de março de 2012

FRÁGEIS DEMAIS (Crônica)

FRÁGEIS DEMAIS

                           Rangel Alves da Costa*


Por mais que as pessoas tentem mostrar demasiada força, queiram carregar rochas no olhar e montanhas na língua, pretendam ter a lava vulcânica correndo na veia e mármores recobrindo a pele, são frágeis demais, e demasiadamente frágeis que nem percebem a gota d’água do tempo que lhes corrói.
Por mais que se revistam do mais endurecido dos metais e pensem que são tão importantes quanto o mais precioso deles; e quanto mais vivam nas ilusões fulgurantes do diamante e da pedra aurífera brilhosa, mais frágeis serão, e tão frágeis serão que nem perceberão o pó da vida que silenciosamente vai se instalando e recobrindo tudo.
Por que querem ser tanto e tão fortes se é na sua parte mais frágil que se revela o homem. Na Bíblia, Daniel assim mostrou ao rei a sua fragilidade:
“Senhor, eis que uma grande, uma enorme estátua erguia-se diante de ti; era de um magnífico esplendor, mas de aspecto aterrador. Sua cabeça era de fino ouro, seu peito e braços de prata, seu ventre e quadris de bronze, suas pernas de ferro, seus pés metade de ferro e metade de barro. Contemplavas a estátua quando uma pedra se descolou da montanha, sem intervenção de mão alguma, veio bater nos pés, que eram de ferro e barro, e os triturou. Então o ferro, o barro, o bronze, a prata e o ouro foram com a mesma pancada reduzidos a migalhas, e, como a palha que voa da eira durante o verão, foram levados pelo vento sem deixar traço algum, enquanto que a pedra que havia batido na estátua tornou-se uma alta montanha, ocupando toda a região”.
Assim é o homem. Uma parte que imagina ser de ferro, e outra parte que é efetivamente de barro. Sendo parte de ferro e parte de barro, logo esquecerá a parte frágil e se arvorará somente da parte que imagina ser sólida demais, inquebrantável. Não imagina, contudo, que se sustenta exatamente na parte de barro, do que foi feito e o que realmente é. E quando mais se acha imbatível mais vai forçando a fragilidade de sua parte ser, sua parte homem, sua parte de barro, que ao não suportar o peso do egoísmo e das vaidades irrompe, derrubando e destruindo toda a parte sólida que estava por cima.
Não há que se negar que assim é a vida, uma solidez que se desmancha no ar, uma força que se dobra, uma potência que vira pó. Ilusões, quimeras, fantasias irracionais nas pessoas, e como acham que podem viver assim, continuar sempre vivendo assim. E lá longe, que tão perto está, o pequeno rio corre exatamente onde antes era uma rocha enorme, imensa e parecendo indestrutível. E veio um pingo, outro pingo, e a água mole acabou vencendo a pedra dura. Assim diz o ditado, mas assim também é na realidade da vida.
Que mundo é este, em que mundo estamos, qual realidade vivemos para que o homem não consiga aprender as lições mais elementares? O frio de um inverno russo já venceu um exército alemão inteiro, com suas máquinas famintas, bombardeiros, tanques e canhões. A poeira do deserto africano já fez outro exército se ajoelhar pedindo clemência. O silêncio da selva nem precisa gritar para vencer todo aquele que se achar dono da situação.
E por que o homem, esse ser frágil demais, delével por essência, acha que é tudo, que pode tudo, que nunca há um limite na sua sede de alcançar os objetivos menos nobres? Talvez nunca lhe venha à mente que as lições se repetem, e que muitos outros Golias continuam sendo derrotados, que as imensas embarcações são derrotadas pelas águas mansas.
E eis a lição maior: “Não estejais ansiosos quanto à vossa vida, pelo que haveis de comer, ou pelo que haveis de beber; nem, quanto ao vosso corpo, pelo que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o alimento, e o corpo mais do que o vestuário? Olhai para as aves do céu, que não semeiam, nem ceifam, nem ajuntam em celeiros; e vosso Pai celestial as alimenta. Não valeis vós muito mais do que elas? Ora, qual de vós, por mais ansioso que esteja, pode acrescentar um côvado à sua estatura? E pelo que haveis de vestir, por que andais ansiosos? Olhai para os lírios do campo, como crescem; não trabalham nem fiam; contudo vos digo que nem mesmo Salomão em toda a sua glória se vestiu como um deles” (Mt 6 25-29).



Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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