ESTÓRIAS DOS QUATRO VENTOS: DIAS CINZENTOS
Rangel Alves da Costa*
Conto o que me contaram...
Dias existem que se a pessoa soubesse nem levantaria para enfrentá-los. São dias que já nascem entristecidos, aflitivos, desesperançosos demais.
A janela está aberta, porém nem parece manhã de sol brilhando, de natureza viva lá fora. O vento que bate na cortina faz um som mais que estranho, arrepiante, dolorido demais. A casa parece mais sombria, tudo é muito silencioso, e não há nenhum motivo que desperte um sorriso.
E tudo se transforma em sofrimento surgido ao acaso. Aquilo tudo, móveis e objetos, sempre estiveram ali, mas de repente a fotografia antiga parece chamar, o livro parece querer se abrir, as pequenas lembranças na estante insistem em reavivar pesarosos sentimentos. Tudo se assemelha às paisagens lúgubres de O Morro dos Ventos Uivantes.
Sem ter nem como, mas parece tempo de nevoeiro, nevasca, de força misteriosa da natureza que tudo faz para prender a pessoa dentro de sua toca. Sim, hibernando iguais a ursos solitários que choram suas saudades frientas. Que fosse um ninho, um ninho quentinho, mas não, apenas um vazio imenso nesse dia que definitivamente não é igual aos outros.
E realmente não há vontade de fazer nada mais, a não ser voltar pra cama e tentar deixar adormecer aquele estado de espírito e acordar motivos de felicidade e vida. Mas não volta ao quarto, fica num cantinho qualquer da sala, toda pequenina num lado do sofá, olhando pela janela somente para sofrer ainda mais. E por que essa lágrima fininha descendo do canto do olho?
O café quentinho não surte efeito algum, o cigarro se transforma apenas em fumaça. Passa por cima do jornal colocado por debaixo da porta e tanto faz que haja acontecimento novo ou não. De nada adiantaria ligar a vitrola na maior altura do mundo, cantarolar bem alto uma canção antiga que fala de uma menina que descobriu a felicidade no amor, gritar, e simplesmente gritar para espantar os fantasmas do entristecimento.
Mesmo que abra todas as portas e janelas, que acenda todas as luzes da casa, que afaste as cortinas e queira de todo jeito tornar mais alegre o ambiente, certamente não surtirá efeito algum. Ora, ninguém jamais saiu vencedor da luta contra o tempo, os dias, as horas, os minutos e segundos, e muito menos contra a natureza do destino. Se haveria de amanhecer assim, encontrar o dia assim, e tudo trazendo tanto sofrimento assim, então só lhe restará esperar o renascimento espiritual.
Tudo isso já acontece desde cedinho e agora está ainda mais forte com a passagem do tempo, mas somente num dado momento sentirá a brisa soprar no rosto, um filete de sol entrando pela janela e afastando as sombras, um canto de passarinho. E de repente e já estará refeita. Mas sem esquecer que os dias que surgem assim, que amanhecem assim, são tão essenciais como parar um tempo para pensar sobre a vida.
E porque a pessoa esquece de separar um tempinho para refletir sobre determinadas situações de vida, de agora e do passado, é que surgem os momentos assim. Pensamento forjado na dor.
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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